sábado, 24 de março de 2012

Tempo cinzento

A Primavera chegou.

E o tempo de céu azul tingiu-se de cinzento desafiando todas as previsões.
Como gosto deste tempo, saí e fui passear ao Botânico, onde não há dúvidas. A Primavera está aí e as plantas sabem-no, sentem-na nas pétalas, nos brotos,
nas folhas, nos odores...é lindo ver a natureza a renascer depois do inverno, este muito meigo e seco. A água faz falta, mas as flores do Botânico têm irrigação especial e nascem na mesma.

Resolvi tomar um chá à inglesa no bar japonês - com empregado brasileiro
- que abriu no ano passado. Tudo ali é requinte, como se pode ver pela foto. O sossego fantástico, apenas umas tres pessoas e algumas crianças no jardim.
Pena não haver exposições, a Casa é tão perfeita para esse fim, está fechada. E Sophia

olha-nos no jardim do labirinto, com os olhos no vago, talvez sonhando com aquela menina que um dia ali brincou, ali escreveu e correu. O tempo passa, os sonhos ficam assim como a poesia.

Poema

A minha vida é o mar o Abril a rua
O meu interior é uma atenção voltada para fora
O meu viver escuta
A frase que de coisa em coisa silabada
Grava no espaço e no tempo a sua escrita

Não trago Deus em mim mas no mundo o procuro
Sabendo que o real o mostrará

Não tenho explicações
Olho e confronto
E por método é nu meu pensamento

A terra o sol o vento o mar
São a minha biografia e são meu rosto

Por isso não me peçam cartão de identidade
Pois nenhum outro senão o mundo tenho
Não me peçam opiniões nem entrevistas
Não me perguntem datas nem moradas
De tudo quanto vejo me acrescento

E a hora da minha morte aflora lentamente
Cada dia preparada


Sophia de Mello Breyner Andresen

quinta-feira, 22 de março de 2012

120.000 visitas

Para comemorar, mudei o visual do blogue.

Em vez de pintura, aparece uma fotografia. Foi tirada no Jardim Botânico, local que tem muito a ver com este blogue, visto fazer parte da minha vida...

Obrigada pelo interesse. espero continuar a merecer a vossa presença aqui.Dancem comigo até ao fim do mundo!

quarta-feira, 21 de março de 2012

Dia Mundial da POESIA

Festejo convosco este dia, partilhando algumas páginas do nosso livro sobre o mar (poesia do meu Irmão Mário e pintura minha) que criámos há alguns meses e que muito me orgulha.




De novo em aulas

Hoje comecei a ir a aulas individuais de informática. Estou a aprender Powerpoint, fazer e-books e não só.

Preciso de me reciclar antes de dinamizar umas sessões de formação para professores no próximo ano. Já me comprometi com a editora e não quero fazer má figura. Além de que me dá muito gozo, hoje ri durante hora e meia, feliz por estar a aprender algo novo e excitante. A professora, 20 anos mais nova do que eu ou mais, riu-se quando eu lhe disse: Cada vez gosto mais de coisas novas!
Trabalhar num novo projecto para o secundário é um desafio enorme nos tempos que correm. Já trabalho com a editora há trinta anos e não pensava voltar depois deste interregno de cinco anos. Afinal, sempre me convidaram para trabalhar mais uma vez... o que me entusiasmou imenso.

A net é um mundo imenso e encontra-se aqui tudo o que é preciso. Um dia escreverei sobre a minha experiência nos anos 80, em que não havia nada senão uma máquina de escrever mecânica e fotocópias. Era tudo copiado várias vezes e as fotos a preto e branco. Mas a minha paixão era a mesma.

segunda-feira, 19 de março de 2012

Casa da Música- O génio de SOKOLOV

Sempre tive uma ternura especial pela Casa da Música.

Ao princípio até considerava quase magia, como é que um meteorito tinha aterrado naquela praça
tão familiar para mim e continha tanto encanto.

Ouvir música ao vivo era quase uma memória do passado, embora tenha apoiado e ido a muitos concertos da antiga Regie Symphonie, no tempo em que eles tocavam em S. Bento da Vitória ou esporadicamente na Igreja da Lapa. Dei-me com vários músicos estrangeiros da orquestra e assisti ao seu último concerto na Foz Velha, antes de se tornarem Orquestra do Porto. Dava aulas de Inglês na Escola Profissional de Música, que durou poucos anos, e lá conheci alguns desses músicos, num ambiente fraternal e extremamente raro aqui no Porto. Uma das flautistas, australiana, foi professora e amiga do meu filho mais velho e ainda hoje ele visita-a na Bélgica, onde ela vive.
A Casa da Música deve ter parecido àqueles excelentes
instrumentistas uma dádiva caída do Céu, pois estavam habituados a tocar em locais diversos, sem ter uma sala condizente com a sua categoria.
Nunca esquecerei o primeiro concerto que ouvi na CdM. Tocaram a Sinfonia nº 2 de Mahler - Ressureição - com o Coro Gulbenkian e solistas excelentes. Comovi-me tanto com o evento que quando saí, telefonei ao meu filho que estava em Munique e desfiz-me em lágrimas de alegria. Tínhamos uma sala de concertos, linda de morrer, com 1400 lugares, uma acústica excepcional, bilhetes acessíveis, salas topo de gama e uma orquestra razoável. Tudo novo para mim.

Mal eu sabia que ali iria ouvir o pianista mais brilhante deste tempo, Grigory Sokolov, considerado o maior pianista vivo por muitos melómanos. Ouvi-o há dois anos e ouvi-o ontem, de novo, num concerto memorável que terminou com 7 encores, qual deles mais vibrante e sentido.

Sokolov não é deste mundo, quando se senta ao piano,
inclinado sobre as teclas, o mundo pára, o siêncio é absoluto e só se ouvem os sons multifacetados em catadupa, numa harmonia quase divina.
Era capaz de o ouvir durante uma noite inteira, o concerto durou três horas aproximadamente...e ninguém queria arredar pé, embora fosse Domingo e houvesse trabalho no dia seguinte. Rameau, Mozart, Brahms - tudo peças que desconhecia numa perfeição total.

Saí de lá mais rica e feliz, o meu filho também. Aprecio todos os momentos assim com ele, há uma grande cumplicidade entre nós. A música clássica sempre foi o elo mais forte que nos une.

Ficam aqui duas peças tocadas por este extra-terrestre musical, uma em recital, outra com orquestra. Os seus dedos não se apoiam nas teclas, flutuam...e o som sai por milagre.