sábado, 8 de setembro de 2012

O piano

Anteontem, ontem e hoje a so-called paupérrima TV ofereceu-me mais deleite para os ouvidos e para a alma que muitos concertos ao vivo a que assisti nos últimos tempos.

Oiço neste momento um programa de três horas todo ele dedicado a Chopin pelo seu aniversário, com a apresentação de algumas obras raras deste compositor, que são explicadas pelos executantes nos intervalos com uma simplicidade comovente.

Esta semana a RTP2 tb esteve de parabéns. Transmitiram quatro programas a horas decentes: 23.30, sobre música e pianistas portugueses: Fernando Lopes Graça, Sequeira Costa, Joli Braga Santos e por fim, Maria João Pires.

Os programas são bastante actuais e bem feitos. Gostei especialmente do que foi dedicado a Sequeira Costa, pianista que sempre admirei, desde os meus 15 anos, quando comecei a assistir às provas dos Concursos Vianna da Mota, na Aula Magna da UL, momentos extraordinários na minha vida de adolescente, em que vibrávamos como se algum dos candidatos fosse nosso familiar.
Conhecemos assim futuros pianista agora consagrados como Pedro Burmester, Artur Pizarro, Nelson Freire, etc,etc.

Sequeira Costateve de lutar contra tudo e todos para organizar estes concursos, em que até o facto de os primeiros prémios serem concedidos aos pianista de leste foi altamente contestado pelo regime.


O trabalho do professor na Universidade de Kansas tem sido incansável e todos nós  devíamos sentir orgulho pelo facto de ele ser um professor carismático nos EUA, já que Portugal lhe não oferecia as mesmas condições. Muitos alunos portugueses e estrangeiros fazem lá parte da sua formação,  exigente, mas quase perfeita.


Ontem deleitei-me com o programa sobre Maria João Pires, de quem já conhecia praticamente toda a biografia, mas que é sempre espantoso recordar. O seu percurso, as suas qualidades, a sua virtuosidade e até a sua personalidade são admiráveis, para não falar da sua popularidade e fama em todo o mundo.

Ouvir Maria João Pires é ouvir sempre uma performance do outro mundo. Não me canso dos seus Improvisos de Schubert, Nocturnos de Chopin e sonatas de Mozart, CDs que guardo religiosamente.

Atrai-me aquela rebeldia, o gosto pela natureza, a sua humanidade - ela cozinhava, ela tratava dos filhos, ordenhava vacas, plantava alfaces e até conduzia o tractor. E depois, como diz Burmester, sentava-se ao piano quando lhe apetecia e tocava do fundo da alma aquilo que lá tinha gravado enquanto labutava.

Nem sempre a TV é má.
Soubéssemos aproveitar até ao fim o que ela nos proporciona....e a nossa alma estaria tão feliz como estes dedos do pianista que correm pelas teclas num ritmo infernal ou numa cadência quase letárgica....fazendo-nos sonhar.